quinta-feira, 19 de agosto de 2010

No país do futebol, o que não falta é crack

Domingo passado um moleque novo (devia ter no máximo uns 22 anos) me chamou no portão de casa pedindo comida e roupa, pois estava com fome e frio. Como já tava tarde, dei 2 pacotes de bolacha e 1 calça comprida pra ele, que me agradeceu e foi embora. Fiquei imaginando o que leva uma pessoa jovem e com saúde ao fundo do poço, tão rapidamente. Seria a desilusão com a vida? A falta de oportunidades? A preguiça? O envolvimento mal-sucedido com o crime? Ou o crack? Se o cara fosse um velhinho doente, abandonado pela família, eu até que entenderia essa decadência. Mas na minha cidade, pelo menos, onde pessoas simples chegam a faturar 2 mínimos pra mais, vendendo papelão e alumínio, só os nóias de pedra é que conseguem chegar a parte mais baixa do poço.

Tenho um amigo que tinha de tudo; uma boa esposa, uma boa família, um bom emprego... De repente, desistiu de tudo após o fim do casamento. Hoje ele ta só o “pó” (ou pedra); passa fome, anda sujo e mal vestido, que nem andarilho. Tem só 38 anos. Por mais que a família tenta o ajudar, ele não se move. Há quem diga que ele ficou assim por causa da ex-mulher. Mentira! O mal dele ta na maldita da droga que ele usa, o crack. Triste fim. Não devia ter experimentado.

Talvez a pedra (crack) seja a droga mais destrutiva que já tenha chegado próximo de minha cidade. Deixa os homens mendigando, as mulheres se prostituindo por 2 ou 3 reais, até que um dia acabam pagando dívidas com a própria vida. O crack em si mata mais por conta dos desafetos que se criam através da adesão (conseqüente de dívidas) dessa droga. E quem mais sofre é a família do usuário. Se o nóia não tem responsabilidade com ele próprio, vai ter com pai, mãe, mulher e filhos?

Tem que ser muito burro para experimentar algo que sabe que faz mal, mas se já experimentou, agora a meta é ser homem para sair. Dizem que é difícil de sair desse vício, mas não é impossível. Conheço pelo menos 3 pessoas que conseguiram sair dessa porcaria de droga; entre eles, 2 primos. Recaídas? Não sei, porque não convivo com eles.

Anos 90

No comecinho dos anos 90, trabalhei em Indaiatuba, numa estação ferroviária (Fepasa), durante 5 anos. Alguns dos funcionários que trabalhavam comigo vendiam e consumiam vários tipos de substâncias ilícitas, entre elas a “casca”, que mais tarde veio ser chamada de crack. Lembro que diziam que a “casca” era a rapa da cocaína e causava dependência na primeira cachimbada. Todos que vendiam esse produto me ofereciam de graça, mas nunca aceitei. Me chamavam de “laranja”, por não aceitar, como se eu fosse menos homem do que eles. 2 anos se passaram e vários daqueles funcionários foram transferidos para outras estações. Foi quando, passando pela Estação de Campinas, encontrei um desses funcionários que me zoavam, que estava bem magro. Ele perguntou se eu lembrava de quando eles me chamavam de laranja porque eu não queria fumar com eles. Completou, dizendo que eu fui mais inteligente e feliz do que eles, já que um deles já tinha morrido de AIDS. Naquela época, todos que usavam cocaína injetável compartilhavam na mesma seringa.